A energia que vem da Liderança

Ser um líder de uma empresa pública ou privada, de uma Associação ou Igreja, seja em que organização for, possibilita aprendizados diversos, mas, em todas elas, existem fatores comuns que definem uma boa liderança, que é a atuação com a sua equipe e o entendimento do seu papel em relação à sociedade. O líder maior de uma organização precisa entender a responsabilidade do seu papel em formar equipes e novos líderes e, assim, ser um motor ou, pelo menos, a energia que move o motor da sociedade.

Quem vem acompanhando meu podcast “Lidere Para O Mundo” sabe que venho entrevistando líderes que se dispuseram a exercer a liderança em setores diferentes do seu setor original. Os três primeiros entrevistados eram empresários que passaram a atuar no Terceiro Setor ou no Setor Público, levando para lá seus conhecimentos empresariais. Mas no quinto episódio eu entrevistei um líder que fez o caminho inverso, o Engenheiro Márcio Félix, que foi funcionário, por mais de 30 anos, da Petrobrás, tendo inclusive exercido a Gerência Geral da Unidade do Estado do Espírito Santo. Márcio foi também Secretário de Desenvolvimento Econômico do mesmo estado e ocupou cargos no Ministério de Minas e Energia, mas, depois de se aposentar, partiu para ser um empreendedor, criando, junto com vários sócios, a empresa ENP Energia, que é uma plataforma inovadora na área de energia.

Eu conheci o Márcio Felix quando nós dois participamos de uma espécie de concurso sobre visões da sociedade proposto pela Consultoria Amana-Key, em 2001. Ele participou com um grupo da Petrobras e eu com um grupo da Secretaria de Fazenda do Estado de Mato Grosso. Dentre tantos grupos do Brasil inteiro que participaram, os nossos estavam entre os 12 que foram escolhidos como finalistas.

Neste desafio nós fomos instigados a responder três perguntas que considero fundamentais se quisermos atuar com a sociedade, que são: “Como a sociedade realmente funciona? Como ela deveria funcionar? Como fazer acontecer esse funcionamento ideal?”. Cada grupo achou a sua forma de responder a estas perguntas, mas todos tiveram que fazer reflexões profundas sobre o tema e isso foi transformador para todos que participaram. Desta experiência nasceu um livro com os trabalhos de todos e pude conhecer melhor a pensamento social do líder Márcio Félix e o seu senso de responsabilidade para com a sociedade e para o que é público. Em 2003 ele me convidou para conhecer o Programa Ciranda Capixaba que eles estavam implantando e eu me encantei com o que vi e com todas as possibilidades que se abriam com aquilo, que era chamado de fractais sociais, tendo sido, mais tarde, convidada a prestar consultoria para o Programa.

Para o Márcio as respostas às perguntas sobre a sociedade não poderiam ser feitas apenas teoricamente e o Programa Ciranda Capixaba era a forma de concretizar os pensamentos do grupo que participou do concurso. O desafio era grande pois o Programa deveria ser inovador e ter uma forma de controle por parte da sociedade e, por isso, surgiu a ideia de fazer uma seleção pública com regras claras e distribuídas em todos os municípios. Segundo Márcio, o Programa deveria “criar capacidade dos municípios em elaborar projetos e quando alguns deles não conseguiam, a equipe do Ciranda ajudava”.

Os projetos selecionados eram implantados com o financiamento da Petrobras, mas de início eles sabiam que este financiamento tinha um tempo determinado e que, ao final deste período, os projetos teriam de ter a capacidade de dar continuidade por si mesmos. Mas, como o próprio Márcio observa, “os projetos não queriam se dissociar da Petrobras, mas precisavam ter sustentabilidade, sendo assim a ideia é que eles pudessem sustentar o nome do Programa Ciranda Capixaba, como se fosse um selo”. Foi então que surgiu o nome de “Cirandinhas” para cada projeto que participava do programa, lembrando uma roda que permanece um tempo ligada e depois vai se desligando e fazendo o seu próprio movimento. Márcio complementa: “cada projeto teria de virar uma Cirandinha para ter vida própria”. Outro ponto interessante do Programa foi uma aproximação entre as lideranças dos projetos Cirandinhas e os gestores da Unidade da Petrobras do ES em atividades conjuntas para que todos se sentissem parte e percebessem que podiam aprender com esta aproximação.

A partir de então muitas coisas foram acontecendo e que não tinham sido planejadas, pois foi sendo criada uma rede de ajuda e de solidariedade entre os próprios projetos, tornando a experiência muito rica. A sociedade local também foi movimentada pelo programa e até mesmo os resultados empresariais foram muito bons neste período, criando um otimismo e uma maior aprovação das ações da empresa por parte da sociedade.

Uma liderança precisa se preocupar em não personalizar demais suas ações e, neste sentido, chegou um momento em que Márcio entendeu que precisava se desapegar e partir para outros desafios, que culminou na sua atuação na iniciativa privada, fazendo uma transição desafiadora que é ser um empreendedor em nosso país. Como alguém antenado com seu papel social, no setor privado vem buscando exercer sua liderança também preocupado com os mesmos valores que atuava na vida pública e isto fica claro quando diz que queria ajudar a construir uma empresa com a “liberdade da iniciativa privada, mas com responsabilidade pública”.

Sua visão sobre a empresa que lidera, a ENP, é que “ela não pode ter preconceito em relação a nenhuma forma de energia, por isso a ideia de uma plataforma. Funciona como um ecossistema energético, com energias que conversam entre si”. Na formação da equipe que atua na empresa também levou em conta a diversidade de ter gerações diferentes, em locais diferentes, tanto no exterior como no interior do país. Márcio diz que: “Criamos um mini diversidade, sem cotas. Um time para ser o fractal de uma organização maior. Com diversidade e com a energia humana alimentando o motor...Como o aprendizado anterior, é como uma ciranda energética no Brasil inteiro, começando pelo estado do Espírito Santo”.

Neste momento em que estamos passando por momentos bem difíceis no mundo e especialmente no Brasil, com toda essa crise do sistema de saúde e a crise econômica provocada pela pandemia do Covid, eu pergunto: será que a nossa sociedade consegue se tornar mais alinhada, mais voltada para os interesses comuns de seus cidadãos? O que precisaria mudar no comportamento da nossa sociedade para que nossas ações possam ser mais eficazes, no sentido de termos um mercado mais socialmente orientado e um Estado mais socialmente responsável?

Márcio entende que é preciso “olhar para a sociedade e perceber que ela pode estar em cima de uma riqueza e, mesmo assim, viver na miséria, no entanto, energia é vida. E a energia mais desperdiçada é a força das nossas ideias. Por isso a importância de colocar várias gerações para trabalhar por uma causa”. Ele não abre mão do valor “Prosperidade”, que é um dos valores da ENP, por entender que a grande motivação das pessoas é contribuir para a prosperidade do local onde elas estão.

Esses exemplos de lideranças são promissores em uma sociedade que se entende como “solidária”, mas tem dificuldade de se organizar para aproveitar melhor suas riquezas em função da sua população. Em parte, podemos atribuir esta culpa aos políticos e dirigentes do país, mas a forma como a sociedade se posiciona e reage interfere também na forma como os políticos atuam. Sendo assim, nós temos muita culpa em termos dirigentes que não conseguem alavancar o país deixando a gente com uma certa saudade de um país que não chegou a acontecer.

Para conseguir destravar o progresso que nosso país é capaz de desenvolver, precisamos ter muitas lideranças que sejam usinas de energia, assim como o Márcio Félix, e estarmos sempre prontos para novos projetos e empreendimentos que façam do nosso planeta sempre um bom lugar para se morar. Como Márcio falou em seu encerramento da entrevista: “tem muito mais riquezas e tesouros nas pessoas do que a gente normalmente imagina... O Brasil tem 210 milhões de pepitas de ouro ou diamantes que muitas vezes não foram lapidados... Quando se lança em uma iniciativa ao universo, aparecem pessoas para ajudar e as soluções vêm. Quando a gente se move para um objetivo de interesse maior, não tem como dar errado”.

De minha experiência aprendi que participar de projetos que envolvam a sociedade nos faz entender melhor qual o nosso papel dentro dela. Com a oportunidade de participar do Programa Ciranda Capixaba, eu pude conhecer melhor o estado do Espírito Santo e vi uma sociedade fervilhante de boas ideias e ótimos projetos e isso me ajudou a entender melhor o meu propósito de ajudar as pessoas e as organizações a serem mais conscientes do seu papel na sociedade.

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