O Brasil é para amadores!

Sempre que ouço a frase “o Brasil não é para amadores” fico refletindo em como as pessoas até falam isso com um certo orgulho por termos uma forma de atuação tão complexa, que se torna um desafio para quem tenta entrar sem entender. Fico pensando que as pessoas acharem que isso é uma coisa boa, pode acabar reforçando uma cultura de que somos profissionais da falta de organização, da burocracia e da malandragem.

O que é ser profissional? É o contrário de ser amador. É ser especialista, perito, expert, técnico, entendido do negócio em que atua. Temos muitos bons profissionais no país, mas o conjunto do que conseguimos como país e como sociedade não condiz com essa realidade. Vamos verificar essa questão por alguns aspectos, começando pelo serviço público. No Brasil, embora a grande maioria dos servidores sejam concursados e foram colocados por seus méritos nas suas funções, parte da liderança é originária de indicação política e não possuem conhecimento nem em gestão e nem técnico específico da área. Não existe uma certificação que dê mérito a quem recebe uma indicação política e boa parte destas indicações acabam sendo ocupadas por amadores.

Nos tribunais, em todos os níveis de governo, embora os funcionários passem por concurso público, os conselheiros, desembargadores, ministros e todos seus assessores próximos, são cargos ocupados por indicação política, sem critérios rígidos que consigam impedir que pessoas sem a formação e experiência necessárias possam entrar e tomar decisões que interferem na vida de toda a sociedade.

O termo “político profissional”, que é usado para aquela pessoa que só vive da política, tem uma conotação pejorativa no Brasil, mas que bom seria se tivéssemos mesmo políticos profissionais, que estudassem, se preocupassem com seu crescimento profissional, em propor melhores projetos, conversar com sua base para realmente entender o que ela deseja e agisse de acordo com a plataforma de ideia que o elegeu. Mas o que temos? Uma grande quantidade de políticos amadores, achando que política é o que eles fazem, ou seja, atuar em causa própria ou para um pequeno grupo que sustenta sua candidatura.

Por conta de todas essas situações, os resultados para a sociedade não são os melhores e podemos citar, como exemplo, o caso recente da anulação do processo contra o ex-presidente Lula, que havia sido imposto pela Operação Lava Jato. Sem entrar no mérito das coisas, o que me espanta é como foi fácil fazer e desfazer situações tão complexas, envolvendo milhares de documentos, centenas de pessoas e recursos públicos aplicados.

Eu não entendo se a linha adotada pelo Juiz Sérgio Moro estava errada - ou no lugar errado, para deixarem isso acontecer e chegar até o ponto que chegou. Agora o STF entende que houve um equívoco, deixando o país em dúvida sobre o que vale em termos de justiça e em risco de ter que pagar indenizações a todos os que foram presos, inclusive àqueles que fizeram delações premiadas. Existem pessoas profissionais envolvidas em todo esse processo sem dúvida, mas a atuação geral da justiça, neste caso, não foi profissional no sentido de obter resultados, com menor custo e atendendo às necessidades dos seus clientes, que neste caso, somos nós, a sociedade.

Outra situação que estamos assistindo é como a pandemia explodiu no país no início de 2021, por falta de profissionalismo em vários níveis de governo, em especial do governo central, responsável por coordenar a gestão da saúde no país. Tudo isso somado à corrupção, que talvez seja um dos processos melhor estabelecido em todos os governos, uma vez que passa de um para outro sem sofrer descontinuidade. Sabemos que o fim desta crise depende do grau de vacinação da população, que pela falta de planejamento fez com que o Brasil ficasse no fim da fila de compra e recebimento dos imunizantes. Fomos amadores novamente.

Com relação às empresas, temos muitos bons exemplos de profissionalismo, tanto nas grandes quanto nas pequenas empresas e nas startups, mas, também, muitos empreendedores partiram para abrirem seus negócios por necessidade e urgência e não por propósito. Às vezes eles têm até um propósito pessoal, mas não possuem o preparo para atuar com a complexidade que é o gerenciamento de uma empresa em nosso país. Boa parte dos nossos microempreendedores não são profissionais em gestão e nem se preparam, por isso o grande índice de mortalidade das empresas já nos primeiros anos.

Somos uma sociedade de amadores? Gostaria de estar usando este verbo no sentido de amarmos muito, mas não. Vivemos um paradoxo de termos excelentes profissionais em suas carreiras, excelentes empresas e outras organizações que atuam isoladamente, mas ainda somos amadores no papel de sociedade. Somos amadores no sentido de agirmos com o nosso país, e com a nossa população, sem os cuidados devidos, sem um propósito comum, com muito improviso e depois rezando para que dê tudo certo.

Somos amadores como sociedade porque não lutamos as lutas certas. Ficamos revezando e discutindo sobre um populismo de direita e de esquerda, quando a verdadeira luta que deveríamos encarar é entre o sistema “Estado” e a Sociedade brasileira. Temos um Estado que parece querer nos extorquir com aumento contínuo de impostos para manter uma máquina cara e ineficaz, e nós permitimos. Recebemos e aceitamos serviços de má qualidade, pagamos por outros que não recebemos e ficamos esperando que um “ser iluminado” possa um dia assumir o cargo de presidente e resolver todos os nossos problemas.

Sim, o Brasil é para amadores, mas esses amadores somos nós mesmos enquanto sociedade. Somos ainda cidadãos amadores por não entendermos nosso verdadeiro papel de combater o bom combate contra os verdadeiros inimigos, que são os corruptos, a criminalidade entranhada em todos os níveis, os políticos sem caráter e todos aqueles que não entendem que profissionalismo pressupõem ética e agir para o bem comum de toda a sociedade, sempre.

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