O desafio da transição entre Setores!

O meu trabalho de consultoria me permitiu conhecer e conviver profissionalmente com muitas pessoas interessantes e muitos líderes que enfrentaram situações desafiadoras para cumprir sua missão, quer seja nas empresas ou junto à sociedade. Nestes anos todos também presenciei muitos embates de ideias diferentes e disputa de espaço de poder e tudo o que é o comum acontecer em todo tipo de organização.

Podemos até dizer que, por fora, toda organização é bastante semelhante, mas a lógica que rege sua atuação é bastante diferenciada e, por isso, para um líder fazer transições entre organizações e entre os setores durante sua carreira profissional é muito importante para uma abertura da visão e de possiblidades diferenciadas de decisões, uma vez que passa a olhar a sociedade por outros aspectos até então não percebidos.

Se um líder está em uma organização do setor privado, por exemplo, ele precisa tomar decisões que implicam em impactos para o seu negócio e para um nível de atores relativamente restrito. Quando ele vai para o terceiro setor representar a classe do seu negócio, por exemplo, suas decisões passam a impactar muitas empresas e muito mais pessoas. Se esse empresário aceita um cargo de Secretário de Estado, ou de Ministro de Governo, todas suas decisões afetam uma sociedade inteira. Não há espaço, ou não deveria haver, para pensar apenas em seu negócio ou sua classe.

O advogado e empresário Ricardo Tomczyk em sua entrevista ao Podcast Lidere Para O Mundo, relatou suas experiências no terceiro setor e no Governo do Estado e deixa bem claro o entendimento que passou a ter a partir das diversas transições de liderança de organizações que fez. Disse ele: “É um desafio enorme, mas não podemos confundir as coisas. Uma coisa é estar do lado privado defendendo seus direitos e demandas e outra coisa é estar do lado do poder público onde este leque é multiplicado, pois não tenho um setor para atender, mas toda uma sociedade. E quando se atende uma determinada causa de um setor isso gera impacto em toda a sociedade”.

Um empresário que aceita este desafio precisa ter claro seus propósitos ao aceitar o cargo, sabendo que vai ter muitos ganhos e aprendizado no sentido de cumprir uma missão de dar sua contribuição social e de fazer um trabalho que vai ajudar o seu setor e toda a sociedade. Se isso não for claro, ele pode se frustrar muito com a experiência. Tomczyk complementa ainda que tanto no terceiro setor quanto na direção de organizações públicas, “gerenciar conflitos, com certeza, passa a ser uma tarefa diária... fazer a gestão de interesses para que haja um mínimo de empatia, passa a ser uma arte. A arte de saber dizer não”. Ele vivenciou na prática que, como são muitos envolvidos e impactados pelas decisões, dificilmente uma decisão vai agradar a todos. Nas áreas públicas, sejam de Estado ou de Terceiro Setor, aqueles que querem agradar a todos, ou seja, serem populares, de início parecem estar conseguindo que essa imagem prevaleça, mas com o tempo, suas decisões se tornam vazias e eles acabam por desagradar a muitos.

Outro ponto importante é perceber que os setores da sociedade e as organizações que os compõem disputam espaço de poder e isso pode fazer com que seus líderes passem a ter visões um pouco distorcidas do seu verdadeiro papel, causando um desalinhamento de decisões. Um exemplo é o que estamos passando no Brasil neste momento, onde os setores públicos estão em uma disputa acirrada e não chegam a conclusões sensatas em termos do que é melhor para nossa sociedade no momento da pandemia. Por outro lado, o setor privado tenta ajudar, mas apenas pode contribuir com doações e logística, já que o papel de combate efetivo à pandemia só pode ser exercido pelo Estado. São serviços que chamamos de “serviços indivisíveis”, uma vez que não como compartilhar decisões, elas precisam ser geradas de uma única central para que toda a sociedade possa ser incluída.

O que deveria ser feito para que se alinhassem?  Tomczyk, em sua entrevista deixa claro a importância das lideranças e que são elas que precisam entender o seu papel na sociedade e levar o setor que lidera a agir neste sentido. Diz ele: “...a começar pelo setor privado, que precisa sair da bolha do seu negócio e entender a sociedade. A liderança do Terceiro Setor precisa ouvir a base mas não, necessariamente, fazer o que a base quer. Por vezes, a liderança é um papel desgastante, mas o líder precisa saber bem o que ele quer, já que o liderado tem uma visão limitada do todo e o líder deve ter uma visão mais ampla. Ser líder gera desgaste, mas se não quer desgaste não se disponha a ocupar o cargo. No final do dia a gente quer ter o problema resolvido ou quer é ter o ego amaciado? Se quiser agradar todo mundo, você vai sair lá na frente com poucas realizações”. O Terceiro Setor está entre o Estado e o setor privado e deveria ser um fator de alinhamento entre os dois, mas muitas vezes ele copia os mesmos defeitos políticos do Estado e a competição acirrada do setor privado.

Sobre o poder público Tomczyk disse que pensa que “o estado é o mais difícil de alinhamento pois o jogo de força é muito maior e mais difuso, pois existem muitas forças políticas e elas são importantes. Talvez precisemos melhorar a atuação do poder público para que a política seja feita de uma maneira mais transparente e mais digna de alcançar o que a sociedade quer...muitas vezes estas forças não estão olhando o coletivo”. Olhar o coletivo é o primordial, é o papel para o qual o Estado foi criado, mas as forças políticas equivocadas acabam distorcendo esse papel e temos um Estado que quando é testado na crise, como agora, mostra que não tem um sentido claro e uma união interna em prol da sociedade.

As experiências dos líderes sempre me fascinam, pois eles são motores da sociedade. Pessoas como o Ricardo Tomczyk viveram momentos históricos de mudanças na vida das organizações pelas quais passaram. Penso que um líder nunca deveria ficar restrito ao seu empreendimento, mas buscar sempre novas formas de dar sua contribuição para a sociedade, ou seja Liderar Para o Mundo e não apenas para seus próprios resultados.

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