O que a vida quer da gente é Coragem
“O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem”. Guimarães Rosa
Certa vez conheci uma pessoa que autodenominava de Maria Suficiente. Parecia uma pessoa comum, mas eu estava enganada. Era alguém que se preocupava e se lançava para tentar resolver genuinamente os problemas de outras pessoas que ela nem conhecia, mas que precisavam muito da ajuda de alguém. Ela ajudava, sem no entanto, criar algum tipo de dependência, apenas um empurrão para despertar a coragem intrínseca que ela acreditava existir dentro das pessoas.
Desde que comecei a estudar sobre ajuda genuína e bem antes de escrever meu livro, eu buscava algum exemplo de uma pessoa que representasse um “ajudante genuíno” na sua essência, ajuda que não fosse filantropia simplesmente, não que eu ache que esta não seja importante, mas minha busca era por autossuficiência.
Quando conheci a Maria e perguntei o porque do nome dela: Maria Suficiente, ela me respondeu que era porque sempre dizia para as pessoas que estava ajudando que ela “não ia ficar a vida toda ajudando, que ela só ia fazer o suficiente para que a pessoa pudesse continuar sozinha”. De tanto eu repetir isso, começaram a chamá-la de Maria Suficiente.
Eu adorei esse nome! Fazer o suficiente para que a pessoa possa continuar é a base do que eu entendo por Ajuda Genuína. É ter a certeza de que cada um possui dentro de si a capacidade de dar conta de sua vida e de seus problemas, mas que as vezes precisam de apoio, de ferramentas, de incentivo e até de ajuda material ou recursos financeiros, mas sem nunca permitir a dependência e o paternalismo, que podem estar travestidos de boas intenções, mas que trazem como consequência a falta de autonomia e da autorresponsabilização.
Saber quando parar de ajudar é tão importante quanto saber quando começar, mas isso não quer dizer abandonar, pois se criam laços e responsabilidades na relação de ajuda genuína, que são duradouros e se transforma em outra forma de relacionamento muito mais maduro, que é entendido como: interdependência. Ou seja, uma relação na qual há ganho para ambas as partes e as pessoas continuam se relacionando porque se gostam ou querem estar juntos em alguns momentos e não porque precisam do outro para sobreviver.
Para ajudar genuinamente é preciso amor e maturidade para gerar no outro, a confiança em si e a coragem para enfrentar os desafios.
Não adianta só termos coragem, temos que reconhecer e aceitarmos nossas pequenas atitudes corajosas de todos os dias. Nascer já é um ato de coragem e a decisão dos pais em trazer uma vida ao mundo também é um grande ato de coragem. A primeira vez que vamos a escola e temos que enfrentar tantas pessoas e ambientes diferentes, é um ato de coragem que pode influenciar toda a nossa jornada estudantil. Aliás, todas as nossas primeiras vezes são ações corajosas rumo ao desconhecido, incluindo cada novo dia que começa. Ajudar outra pessoa, um grupo de pessoas, ou uma organização, também requer coragem, especialmente nas primeiras vezes.
Um consultor quando começa um trabalho, assim como um colaborador iniciando em uma empresa, está entrando em um ambiente novo, que não sabe o que vai encontrar. Quem vai resistir ao que ele se propõem a fazer? Quem já está traumatizado de outras tentativas de ajuda frustradas? Enfim, são muitos os fatores em jogo quando se começa um trabalho, incluindo o jogo de poder existente. Por isso é preciso coragem.
De acordo com a pesquisadora americana Brené Brown, a palavra coragem não significa apenas bravura, pois vem do prefixo "cor", que significa coração, mostrando que todo ato de coragem não é fruto apenas da mente, mas principalmente do coração. É um ato de amor, não apenas pelos outros, mas principalmente com a gente mesmo, com a nossa integralidade que se fortalece quando nos jogamos por inteiro na atitude de sair da nossa comodidade e agir.
Sempre que falo com alunos ou pessoas recém-formadas que querem seguir a carreira de consultor, eu recebo a pergunta: mas você não teve medo de se lançar em uma carreira com tantas dificuldades? E eu respondo: com certeza, sim. Eu tive muito medo e ainda tenho. Mas, como diz Fernanda Montenegro, o “frio na barriga” precisa existir, é sinal de responsabilidade com o público. É assim para o artista, é assim para todos nós, em nossas carreiras. Temos medo, mas enfrentamos.
Muitos não conseguem, estão presos em armadilhas do corpo, da mente ou do espírito e precisam de ajuda para conseguirem dar seus pequenos passos, que são também grandes atos de coragem.
Reflita um pouco, quais pequenos atos de coragem você tomou nos últimos tempos? Com certeza foram muitos, valorize-os!
Essa reflexão, mesmo que não leve você a mudar o rumo da sua vida, pode lhe ajudar a se posicionar melhor nos próximos passos e quem sabe começar a quebrar cada barreira imposta por você mesmo e ir adquirindo mais autoconfiança.
Confiança nasce do caráter, da competência e do amor por tudo o que fazemos. Ao adotarmos uma atitude de confiança, podemos mudar o meio e fazer com que outros também passem a ter essa atitude e se abrirem para dizer qual a origem da desconfiança presente no ambiente.
Os verdadeiros “ajudantes genuínos” têm essa capacidade de encontrar estratégias que os ajudam a vencer os medos e a transparecer a confiança necessária para que o outro perceba e se sinta também capaz de superar um momento difícil.
Tem uma frase atribuída a Clarice Lispector, mas que ela mesma afirmou que, que não é de sua autoria, que diz “Tenho medos bobos e coragens absurdas”, que nos traduz nossa vida cotidiana de mistura de medos e coragem, pois este é o grande desafio que a vida nos impõe.
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